segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Sobre comédias românticas ...

"... Para nós, humanos, o mundo das aspirações é tão importante quanto o da realidade. Vivemos em um mundo de referências culturais e psicológicas. Se erguemos dentro de nós um cenário de sonho, é fatal que ele seja comparado ao que se apresenta no mundo real, com resultados imprevisíveis.

Talvez o escapismo desses filmes exacerbe as nossas dificuldades com a realidade. Talvez alguns de nós sejam contaminados pelo romantismo das comédias e – mesmo sem saber - passem a vida esperando o par perfeito do cinema.

Ou então, de um jeito igualmente daninho, essas fantasias talvez nos façam olhar para as nossas relações reais com uma ponta de amargura e desapontamento – cadê a beleza perfeita, o humor perfeito, a diversão permanente? Acho que todos já sentiram alguma vez o retrô gosto amargo da fantasia cinematográfica.

Dito isso, é bom não exagerar na tese. As pessoas estão vendo filmes românticos no Ocidente há quase 100 anos e a taxa de natalidade (ainda) não se tornou negativa. No Brasil, milhões de pobres morenos assistem ao desfile diário de riqueza, arianismo e fantasia das novelas – todo mundo é rico, loiro e vive apaixonado – sem que isso tenha provocado ondas de suicídios coletivos.

As pessoas sabem separar realidade de fantasia, não são esquizofrênicas.

A minha experiência, porém, sugere que os mais felizes em qualquer meio são aqueles que vivem com os pés no chão. São aqueles que se misturam prazerosamente às pessoas e à realidade em torno deles, que fazem parte do cenário e atuam nele. Pessoas felizes vivem intensamente a realidade, não os filmes.

Quando se trata de casais, é o mesmo. Sempre tive impressão de que os melhores, os mais felizes, eram formados por pessoas práticas, capazes de olhar para a vida como ela é – e não como deveria ser num roteiro de filme ou num script de novela.

Quando se é capaz de amar pessoas reais no mundo real, é muito mais fácil ser parte de um casal duradouro. Românticos têm mais dificuldades. Para eles se inventou o mercado das emoções baratas. Para eles são feitas as comédias românticas. Elas são bacanas, enchem uma tarde, mas não deveriam realmente influenciar as nossas vidas."

(Por Ivan Martins, em 22/09/2010, na Revista Época on line)

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